29/11/2007

eu era uma pessoa com poucos problemas antes de comprar um cachorro. agora eu sou uma pessoa com um cachorro e um único problema: um cachorro! um animal atormentado que pula, baba, late, cava buracos no jardim, coloca terror no gato do vizinho, espanta borboletas, come pardais, suja a entrada da garagem, mastiga a correspondência, prepara ciladas para o carteiro, morde o meu calcanhar, ataca conhecidos, abana o rabo para desconhecidos, dorme a noite inteira e come mais ração que um urso. esse cachorro só pode ser um karma (carma? sei lá como se escreve isso!) ou então tá zoando com a minha cara.

28/11/2007

Porque Hoje é Quarta-Feira


porque hoje eu não tô bonzinho. porque acabaram as Aspirinas, o café e os cigarros. porque estou escutando U2 — Until The End Of The World e pensando seriamente em matar meu vizinho que escutou Racionais MC a manhã inteira. porque alimentar fantasias com mulheres de papel aos sábados ou qualquer outro dia da semana é uma babaquice. porque isso não é da minha conta, não me interessa, mas quero complicar. porque preciso entregar um trabalho criativo e colorido e feliz como comercial de margarina até o meio-dia — cara, até pra comprar pneus as pessoas precisam de um atormentado como eu inventando mentiras... que porra é essa?! e porque não tenho nada pra dizer além de um, educadamente, comprem qualquer pneu e fodam-se!

26/11/2007

amanhã preciso acordar cedo, suspirar impotente ao perceber as novas marcas gravadas no envelhecido rosto refletido no espelho, preparar um café amargo, recolher as roupas abandonadas pela casa, ignorar o jornal e as correspondências comerciais, levar o lixo para rua, observar por alguns minutos as nuvens no céu e as ervas que cresceram no jardim. amanhã preciso aceitar o silêncio do telefone e a ausência de convites, cigarros acesos, copos sobre a mesa, sorrisos, conversas e aprendizados sobre o amor e ao que foge do comum — o comentário comum, o scrap comum e as promessas de uma vida comum impressas na carta de Ilana em 4 de agosto de 1976. não terei cafés e cataventos, esquinas que levam para o rio, caminhadas na chuva, horas entorpecidas de inquietação, garçonetes desesperadas, cumplicidade explícita, amores perdidos, amores sublimes, vôo sobrenatural, a melancolia, ironia e encantamento de Porto Alegre. vou procurar agendas, extratos do cartão de crédito e algum sinal de Terra existente nesse enigma astral que me coloque novamente no chão. amanhã a saudade depositada lentamente sobre todas as coisas vai me fazer companhia e me impulsionar para o próximo encontro.

25/11/2007

ela não quer mais se apaixonar. quando a conheci, pensei: essa é das complicadas — oba! agora pronuncia cada palavra como se estivesse fazendo uma declaração de amor ao avesso. minha cabeça começa a girar. teria ela encontrado uma paixão qualquer que almas condenadas como a minha desconhecem completamente o sentido? budismo, gatos pardos abandonados nas ruas, missão humanitária em Serra Leoa... sei lá! procuro alguma contradição no seu olhar. nesse instante a música começa a tocar: but any fool knows, that there's no way to win, here we go again... maldito Ray Charles! ai-ai-ai, penso. nunca estive interessado, pra que continuar? ela não espera que eu acredite. não depois de todos esses anos. sou o cara errado para esse tipo de conversa. sou cínico, ela sabe. pronunciar frases soltas como bilhetes de suicidas não vão nos levar para nenhum lugar. no máximo, aviso: não pule de prédios altos, durante a queda há tempo demais para se arrepender. quer salvar-se de si mesma. como uma faísca aprisionada num iceberg, em A caixa preta, de Amós Oz. ela tem um amor impossível... é isso! ninguém consegue disfarçar um amor impossível, suponho. em algum tempo e lugar, uma voz, um jeito de sorrir, segurar o cigarro, vestir ou caminhar, ou a loucura ou a solidão ou a insatisfação, nos fazem lembrar. poderia explicar que não existem amores impossíveis, existem pessoas impossíveis. e também existem pessoas possíveis e um céu de um azul muito brega e mais feliz e blá, blá, blá... e daí, quem se importa com a cor do céu numa hora dessas? maldito uísque! meus pensamentos começam a dançar. James Blunt cantando i would call you up every saturday night, and we`d both stay out till the morning light, and we sang, "here we go again" também não está ajudando muito. preciso parar com essa mania psicótica de pesquisar letras de música no Google. a ignorância é a felicidade na sua forma mais pura. começo a desconfiar de que estou bêbado e perdendo a consciência e a falta de consciência também é uma forma de alcançar a felicidade... ou o nirvana, que, no budismo, é a ausência total de sofrimento, a paz e plenitude a que se chega por uma evasão de si. ahn, gatos pardos! acho que dá na mesma! agora estou me dispersando, que legal! tento me recompor apoiando o que resta da minha lucidez e equilíbrio sobre o copo de uísque. eterno déjà vu. óquei, poderia confessar que se for pra falar de amor, a minha resposta é sempre a imensidão. não para ela, porque aí já é pós-graduação em não saber amar. ela espera alguém que a faça evadir-se completamente de si mesma. eu procuro alguém para enlouquecer de vez atravessando todos os meus limites internos! deve ser essa lua pervertida em Peixes que me assombra todas as madrugadas. e que música é essa que está tocando agora? ah, Fergie e big girls don't cry já é demais! volto a respirar, mas a conversa mudou completamente de rumo. alguém está falando em morar no Canadá. Canadá!? por que alguém mudaria seu endereço para o Canadá? por que alguém partiria numa manhã de sol em direção a Serra Leoa? por que ela não quer mais se apaixonar? pouco me importa! meus pensamentos começam a abandonar o bar e, juro, se alguém mais se aproximar dessa Jukebox também vou embora.

22/11/2007

estava fazendo uma retrospectiva e percebi que 1) meu círculo de amizades tem sérios problemas ou 2) preciso repensar minha vida, meu universo e tudo o mais. meu amigo-A virou evangélico e não atende mais meus telefonemas. outro dia enviou um e-mail dizendo que "só Jesus te ama". até agora não entendi muito bem o significado dessa mensagem. o amigo-C (porque o B sou eu) tem como melhor amigo um Cocker Inglês que, ele jura, prefere assistir filmes sem legenda. o amigo-D passa as noites fumando maconha e jogando vídeo-game. o amigo-E afirma o tempo todo que eu sou o seu melhor amigo. sempre que faz essa declaração, respira demoradamente, como quem faz um inventário da própria vida, e depois começa a chorar compulsivamente.

21/11/2007

queria escrever um texto legal para falar de pessoas muito especiais. escrevo. deleto. escrevo, escrevo, escrevo. deleto, deleto, deleto. e minha memória é igual bolha de sabão: limpa, transparente e leve, depois se desmancha no ar. para não perder minhas lembranças, transformo tudo em sentimentos. transformar em palavras é outra história. acontece que estou em êxtase. sabe assim? algo como admirar a extensão do seu corpo em outro corpo — estou falando de amor, não de sexo! e continuar desejando ainda mais, resistindo ao sono. ahn... não era exatamente sobre isso que eu queria escrever, mas devo confessar que esta foi uma ilustração bem atraente.

queria escrever um texto legal sobre o sabor das ostras — "ostras tem gosto de mar!" escrever sobre pimenta, vodka com morangos ou maracujás, mensagens no celular, samba de bar em bar, mesa para quantos?, além do Pontal, o Rio encoberto, dentro do carro ou caminhando na chuva, Kelvin, São Jorge, Pessoa, Amós, Drummond e os Incríveis, frases de duplo sentido, interpretações cinematográficas na hora do jantar, fotografias nas paredes, árvore de Natal com a lua lá no alto, madrugadas de riso fácil, café preto pra lá de forte — alguém precisa ensinar essa criatura a passar café!, bolhas de sabão, amigos, Dois Irmãos, sonâmbulos e perdidos no Galeão, uma vontade de ficar... enfim, queria escrever um texto legal. mas antes preciso parar com essa mania de voltar para casa trazendo o mundo inteiro dentro do olhar.

13/11/2007

acordei com um movimento no edredon. pensei: amarelo. não. isso é outra história. tentei organizar os pensamentos que sempre me hostilizam na primeira luz da manhã. onde está minha dor de cabeça? ah, sim, aí está. onde está meu mau-humor? ah, óquei! preciso colocar as roupas na mochila. preciso regar as plantas antes de sair. que plantas!? e quem está movimentando o outro lado do edredon? prendo a respiração. não. melhor continuar respirando. vou fingir que estou dormindo, sabe assim? começo um processo de martirização pessoal — vou parar de beber! o segundo passo é de beatificação — nem bebo tanto assim! finalmente me inocento de qualquer culpa — as pessoas deviam parar de beber! lambidas no meu pescoço. meu deus — como se eu acreditasse em algum deus. logo hoje que vou viajar? preciso lembrar de alguma coisa que me dê uma pista de como essa criatura foi parar no meu edredon. conflito na região da Caxemira. alta de 20% das ações da Petrobrás. ahn... acho que isso não vai ajudar muito. noite fria de novembro em Porto Alegre. a cerveja acabou. 03h45min da madrugada. agora sim, estou enxergando uma luz. não. melhor manter distância da luz. li relatos estranhos sobre pessoas estranhas que vivenciaram experiências estranhas com uma luz estranha. alguns foram por aí e nunca mais voltaram, outros voltaram e estão por aí ainda mais estranhos. agora, latidos. que criatura mais louca! puxo o edredon buscando proteção. preciso me concentrar e encontrar uma saída. reescrever o roteiro. a cerveja acabou. lua nova. brincar de procurar constelações. vento. não encontrei as chaves e a porta ficou apenas encostada. mais latidos. claro, como não pensei nisso antes? e a solução emerge do nada como nos romances policias de... ah, aquele autor que não lembro o nome. afasto o edredon e o meu cachorro está há dois centímetros de distância. latindo. lambendo. rebolando. babando. arhg! um travesseiro voa pelo quarto. um edredon voa pelo quarto. um cachorro voa pelo quarto. preciso encontrar as chaves. colocar as roupas na mochila. comprar uma coleira para o cachorro. fechar a porta. comprar outro cachorro. preciso colocar alguma ordem no dia. comprar algumas plantas. onde estão as Aspirinas?

12/11/2007

pensei muitas coisas e não consegui me fixar em nenhuma delas: o calor derretendo os azulejos da cozinha. o calor derretendo o silêncio da rua vazia. o calor derretendo o que resta do dia. o Mago, o Papa e a Dama do tarot. Camus para conquistar e esgotar todo o encanto de um sim sem nada perguntar. Camus para chamar de verdade a tudo que continua. Camus para a ausência de lições, amargas filosofias ou a grandeza do ser... que beijos e perfumes selvagens despertem o centro da noite. acendam um cigarro. debochem do meu mau-humor. contem-me um segredo. prendam-me entre suas pernas. ignorem a novidade sofá-verde-musgo na sala. arrumem a mochila para roteiros de viagens e óculos de sol para cenários feitos de sol. transformem as páginas de Camus em origamis coloridos. mudem o disco. Maria Rita — tá me deixando louco. Jamie Cullun — we will spend it all at sea. e quando eu pensar muitas coisas e não conseguir me fixar em nenhuma delas: mostrem-me o olhar brilhante da vida.

e parei com Camus! está decidido.

08/11/2007

só para constar: não sou o assassino, mas tenho um cadáver no porta-malas do carro.

Ripley Underground, Roger Spottiswoode (2005)

06/11/2007

diz a lenda urbana que os norte-americanos desenvolveram duas fórmulas secretas: 1) para explodir a cabeça de todos os habitantes do planeta, na hora que bem entenderem — você já comeu um BigMac? então, já era! e 2) para escrever BestSeller's. como nunca comi um BigMac nem fui assinante do Círculo do Livro, acredito que minha cabeça permanecerá intacta... ahn, sem comentários!

sobre os BestSeller's e BigMac's não tenho nada a acrescentar, mas uma coisa posso afirmar, até porque todo mundo já sabe: os norte-americanos inventaram uma fórmula para reescrever o final da história e ganhar muito dinheiro no cinema.

depois de anos de resistência, assisti Pearl Harbor (Michael Bay, 2001). incrível! o filme tem a mesma cara de pau e roteiro de Titanic! só mudaram a época tão-tão-distante, os atores canastrões que formam o triângulo amoroso e o local da grande tragédia. o resto está lá: muita gente morta boiando na água, um desejo incontrolável de voar e um trilha sonora de emocionar até uma mula...

e mais essa agora?! não sei onde arrumei essa mula! óquei, inspira, expira... e como não faço a menor idéia de como terminar esse papo-furado, acho que vou aproveitar o surgimento dessa mula e levar ela pra passear! fui!

04/11/2007

ontem, observei um plátano florescendo e lembrei de vocês. lembrei de nós. de nossas conversas em horizontes de inquietação. transmutação permanente de como experimentamos a vida abrindo janelas de luz que resistem à acomodação da sala. essa presença tem atravessado violentamente cada manhã e me surpreendo folheando lembranças como se fossem páginas de um livro — histórias de amor, desaviso e a coragem do impossível, desdém e os sapatos de Ramil, meninos embriagados de absinto, cigarros e cinzas. proximidade que abranda a ausência do mesmo céu como folhas secas de um plátano cobrem o chão de coisas que ficaram por dizer e já não importam mais.

estou pronto. levo no olhar o brilho de postais que já conhecem: ruas, esquinas, casas, o muro da Mauá, um rio que não é rio, bancas de livros, Menino Deus, Cidade Baixa, Moinhos de Ventos, cafés, cinemas, gírias e a melancolia das roseiras de Caio Fernando Abreu. levo todo o fingimento e ironia de um personagem inventado para provocar, mas também levo toda fragilidade e lealdade. levo-me inteiro.

a saudade não coube na mala. sei que a reencontrarei por aqui quando voltar, louca, arranhando a solidão com dedos de sufocar. roupas, perfumes, presentes, outros planos e sonhos e itinerários, apenas aguardam o embarque no avião. chego no início da madrugada, destino de todos aqueles que perdem o sono insatisfeitos com a cena vulgar. e o tudo sem pensar, o fora do comum e o desigual, sugiro guardar para mais tarde, para quando eu chegar.

02/11/2007

coisas para lembrar

drive me crazy
squeeze me lady
with you


um amigo meu é que estava certo: o ruim nessa história de ficar passeando de quarto em quarto é que numa dessas o cara acaba se perdendo no corredor.

* Ed Motta

01/11/2007

suspiro... há dois dias estão tentando me convencer que a tulipa (taça) tem alguma semelhança com a tulipa (flor). há dois dias estão afirmando que não tenho boa vontade ou nunca fico suficientemente embriagado pra perceber essas coisas. o problema é justamente esse: nunca fico suficientemente embriagado. para olhar através desse caleidoscópio que distorce tudo a partir de adivinhações e comparações do tipo flor em copo de vidro, diálogos e cenários e comportamentos imaginários, acreditando exclusivamente nas próprias conclusões, é preciso ter muuuuita boa vontade! óquei, algumas vezes sou precipitado, fantasio algumas lendas urbanas e depois tenho que recuar como se tivesse levado um tapa na cara — e sei do que estou falando. tsc! mas não penso em me vingar... não, não, não sou assim! espero ter merecido e que aquele não tenha sido o nosso "final feliz". para algumas situações, só me resta manter o bom-humor. e talvez, eu disse "talvez", exista mesmo alguma semelhança entre a flor e a taça.